Ritmo das despesas tem surpreendido a um ponto que as receitas não estão conseguindo acompanhar. Governo terá que cortar gastos obrigatórios para se manter dentro da responsabilidade fiscal.
Por g1 — Brasília
28/11/2024 16h53 Atualizado há 5 horas
O corte de R$ 70 bilhões em gastos, apresentado pela equipe econômica nesta quinta-feira (28), faz parte de uma iniciativa do governo para cumprir as metas fiscais previstas em lei em meio a um cenário desafiador para os próximos anos: com despesas disparando e receitas insuficientes para cobrir o rombo.
Pela regra do arcabouço fiscal — a âncora fiscal do país, aprovada pelo Congresso e sancionada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano passado — as despesas do governo só podem crescer atreladas a uma proporção do crescimento das receitas. Assim:
▶️ O governo tem uma meta de resultado primário a cumprir. Resultado primário é o que sobra nas contas públicas após descontar as despesas das receitas. Para 2024, por exemplo, a meta é zero. Ou seja, receitas empatadas com despesas.
▶️Só que existe um intervalo de tolerância (para mais ou para menos) para esta meta, que é de 0,25% do PIB. Assim, em 2024, o governo pode atingir um déficit fiscal (despesas maiores que receitas) de R$ 28 bilhões. Mesmo assim, a meta estará mantida.
▶️ Essa é justamente a previsão para as contas públicas de 2024. Um déficit de R$ 28 bilhões. Ou seja, no limite da meta.
Nesta reportagem você vai ver:
- Por que as contas públicas estão no limite
- Por que os cortes miram as chamadas despesas obrigatórias
- E o que acontece na vida real se a meta fiscal não for atingida ano a ano
No limite
Se, em 2024, as contas públicas já estão sufocadas, a previsão para os próximos anos desperta precaução no governo.
Isso porque o ritmo das despesas tem surpreendido a um ponto que as receitas não estão conseguindo acompanhar.
Nas últimas previsões divulgadas pelo governo, em boletim deste mês, a trajetória do déficit para os próximos anos é a seguinte:
- Em 2025: 0,72% do PIB (ou R$ 89 bilhões)
- Em 2026: 0,59% do PIB (ou R$ 78 bilhões)
- Em 2027: 0,47% do PIB (ou R$ 66 bilhões)
Isso significa que a meta de déficit zero, a se manterem as condições de hoje, não vai ser atingida no governo Lula, contrariando o que foi planejado pela equipe econômica.
Despesas obrigatórias
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O cerne do problema são as despesas obrigatórias. São aquelas que o governo é obrigado a pagar todos os meses, como, por exemplo, o salário dos servidores públicos federais. É o caso também das despesas com previdência, como as pensões dos aposentados.
Quanto mais crescem as despesas obrigatórias, mais elas sufocam as despesas discricionárias (que são aquelas que o governo pode fazer de acordo com sua vontade, como investimentos em infraestrutura).
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Se as despesas obrigatórias crescem demais, sobra pouco espaço para os investimentos do governo. E a economia começa a ficar travada, já que o governo fica com poucos projetos.
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Só no último bimestre, as despesas com previdência subiram R$ 7 bilhões acima do que o governo estava prevendo. Os gastos previdenciários tem sido a maior fonte do aumento das despesas.
Isso tem acontecido porque mais pessoas estão se aposentando, entrando de licença e sendo diagnosticadas com doenças.
O corte — que prevê economizar R$ 70 bilhões em 2 anos —, apresentado nesta quinta, mira justamente as despesas obrigatórias. O governo pretende, por exemplo, limitar o crescimento do salário mínimo e do abono (gastos que impactam a Previdência).
Esse pacote ainda tem que passar pelo Congresso.
Consequências de não bater a meta fiscal
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A meta fiscal é um termômetro da saúde das contas do governo. Se o governo fica muitos anos em sequência sem cumprir o objetivo, os agentes financeiros começam a desconfiar da capacidade do país em honrar suas dívidas.
Isso gera um ciclo vicioso: os juros sobem, já que o Brasil fica menos atraente para investimentos. A inflação também sobe, porque, para bancar seus gastos descontrolados, o governo se endivida acima da capacidade de pagamento. A economia perde tração, o desemprego aumenta.
Para se ter uma ideia, a relação entre a dívida pública brasileira e o PIB do país será ascendente nos próximos anos, se as condições atuais se mantiverem, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI):
- 2024: dívida em 86,7% do PIB
- 2025: dívida 89,3% do PIB
- 2026: dívida 90,9% do PIB
O crescimento da dívida do Brasil está acima da média para países igualmente emergentes, o que mostra a necessidade de controle das contas públicas.
Isso se reflete na inflação. O governo, na semana passada, elevou a previsão de inflação para 2024, de 4,25% para 4,4%.
Para 2025, a estimativa passou de 3,40% para 3,60%.
🔎Porque isso importa? Quanto maior a inflação, menor é o poder de compra das pessoas, principalmente das que recebem salários menores. Isso porque os preços dos produtos aumentam, sem que o salário acompanhe esse crescimento.
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Além dos problemas gerados na vida real das pessoas, o não cumprimento da meta fiscal significa que o governo desobedeceu as regras do arcabouço, o que pode gerar punições administrativas.