
A Ordem dos Advogados do Brasil no Piauí (OAB-PI) solicitou a suspensão de um projeto de lei que prevê a repatriação de imigrantes em Teresina, com custeio pelo município. A proposta, de autoria do vereador Pedro Alcântara (Progressistas), foi apresentada nesta terça-feira (18) na Câmara Municipal.
As Comissões de Direitos Humanos e de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-PI emitiram uma nota alertando que o projeto pode representar riscos de violações aos direitos humanos e contraria dispositivos da Constituição Federal.
A OAB-PI defende que os poderes Legislativo e Executivo municipais devem focar em políticas de acolhimento e integração, evitando ações que possam resultar em xenofobia institucional ou exclusão social.
O vereador Pedro Alcântara, procurado pelo g1, não se manifestou até a publicação da matéria. Em entrevista na terça-feira (18), ele afirmou que a proposta tem o objetivo de possibilitar que imigrantes residentes na capital possam retornar voluntariamente a seus países de origem.
“A prefeitura vai custear a passagem de retorno para qualquer estrangeiro que resida aqui e não tenha condições de pagar sua volta”, explicou o vereador.
Ele negou que o projeto tenha sido elaborado especificamente para os Povos Indígenas Warao, da Venezuela, que vivem em Teresina, mas reconheceu que eles serão afetados pela medida. “O projeto estabelece uma política de imigração em Teresina. Coincidentemente, vai abranger os venezuelanos”, afirmou.
No entanto, o parlamentar fez diversas declarações relacionadas aos Warao que vivem na cidade. Ele mencionou que há 49 famílias venezuelanas na capital, sendo que 44 recebem o Bolsa Família e quatro o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Além disso, afirmou que essas famílias têm alimentação garantida e moradia.
“Eles agora querem um assentamento, cada um quer uma casa com três quartos. Ora, é melhor mandá-los de volta do que construir aqui. Durante a semana, eles ficam nos semáforos pedindo dinheiro. Eles têm comida, mas querem dinheiro para beber. No domingo, é uma farra danada”, declarou.
O vereador também afirmou que o projeto foi elaborado com o apoio do prefeito Silvio Mendes (União Brasil). “Conversei com o prefeito, e ele disse: ‘Faça o projeto que eu sanciono’. A prefeitura prefere financiar o retorno deles a ter gastos permanentes”, disse.
A assessoria do prefeito informou que ele está em viagem oficial a Brasília e tenta contato para comentar a declaração do vereador.
A OAB-PI ressaltou que os Warao fazem parte da comunidade migrante da cidade e que muitas crianças dessas famílias já nasceram no Brasil, sendo, portanto, indígenas brasileiras.
“É fundamental garantir que suas especificidades culturais, sociais e identitárias sejam respeitadas. Por isso, propomos a realização de audiências públicas para que a comunidade migrante e indígena possa se manifestar e participar das decisões que afetam suas vidas”, destacou a entidade.
Trechos da Nota da OAB-PI
As Comissões de Direitos Humanos e de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-PI manifestaram preocupação com o projeto de lei que propõe uma política de imigração em Teresina baseada no retorno de migrantes ao país de origem, com financiamento municipal e estadual.
A OAB-PI notificou oficialmente o presidente da Câmara Municipal, Enzo Samuel, e o vereador Pedro Alcântara, sugerindo a suspensão do projeto e se colocando à disposição para colaborar na construção de uma política migratória alinhada aos direitos humanos e à legislação vigente.
O órgão alertou que a proposta apresenta sérios riscos de violações aos direitos humanos e contraria a Constituição Federal, a Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) e tratados internacionais assinados pelo Brasil.
A OAB-PI reafirmou a importância de aprimorar e expandir políticas públicas já existentes para garantir moradia, saúde, educação, trabalho digno e assistência social às pessoas migrantes. Além disso, ressaltou que qualquer ação voltada a essa população deve ser debatida de forma democrática e participativa.
Como parte da comunidade migrante de Teresina inclui os Povos Indígenas Warao, a OAB destacou que qualquer política pública que os afete deve respeitar a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que assegura o direito à Consulta Livre, Prévia e Informada.
Por fim, a entidade propôs reuniões técnicas com os poderes Legislativo e Executivo, além de representantes da sociedade civil, para elaborar uma política migratória justa, inclusiva e alinhada aos direitos humanos.
“A OAB-PI continuará acompanhando o debate sobre políticas migratórias em Teresina para garantir que os direitos fundamentais dessa população sejam respeitados”, concluiu a nota.