Na hora de fazer as compras, um dos grandes desafios da inflação atual é a alta generalizada dos preços dos alimentos. Esse aumento espalhado dificulta a estratégia dos consumidores de substituir produtos para economizar.
Não se faz uma omelete – ou se mantém um bom restaurante – sem ovos.
Repórter: Quantos ovos por dia?
Daniel de Souza Cunha, cozinheiro: Em média, 112 ovos por dia.
Repórter: Então essa inflação pesou no orçamento?
Daniel de Souza Cunha: Pegou em cheio. A gente precisa se adaptar bastante ao mercado.
Repórter: Foi preciso repassar o custo para o cliente?
Daniel de Souza Cunha: Um pouco, mas nada significativo.
Para as famílias que já enfrentam um orçamento apertado, o aumento no preço do ovo de galinha foi mais um golpe: a alta foi de 15% em fevereiro. E esse não é o único problema.
“A inflação atual está espalhada. Em média, tudo está subindo mais do que esperávamos. Não dá para culpar apenas o clima, o estresse de um animal ou chuvas em uma região específica. Quando analisamos uma cesta com 400 produtos, percebemos um aumento consistente mês a mês. E, no acumulado de 12 meses, essa alta quase não dá trégua”, explica Pierre Oberson de Souza, professor de finanças da FGV.
Sem escapatória
“Aqui tem um sacolão, ali tem um mercado e outro logo adiante. Já fui em um, passei aqui e depois vou naquele”, conta Maria Gertrudes do Nascimento Santos, encarregada de limpeza.
Quase nada escapa da alta.
“O maracujá está um absurdo, o abacate também. Na verdade, está tudo caro”, diz a acompanhante terapêutica Rebeca da Silva Souza.
O preço do abacate, do alho, da laranja-lima e da tangerina disparou. Nem o café ficou imune: 75% dos alimentos subiram nos últimos 12 meses, mais do que no ano anterior, quando a alta atingia 62% da cesta do IBGE. Ou seja, três em cada quatro itens pesquisados ficaram mais caros.
A inflação reflete um conjunto de fatores: excesso ou falta de chuvas, valorização do dólar, aquecimento da economia com aumento de emprego e renda. Mas, segundo os economistas, quando quase tudo sobe ao mesmo tempo, temos a expressão mais clara do que é a inflação — um ciclo difícil de prever quando começa e quando termina.
Comer em casa? Alta de 7,1%.
Fora de casa? 6,72%.
Ambos acima da média geral da inflação.
A solução não está apenas na cozinha de Gertrudes ou no restaurante de Daniel, mas no ajuste da política econômica, aponta o professor da FGV.
“Quando o governo gasta muito, ele injeta mais dinheiro na economia, fazendo com que as pessoas consumam mais e gerem nova pressão inflacionária. É por isso que a contenção dos gastos públicos é essencial para segurar a inflação”, conclui Pierre Oberson de Souza.