Segundo fontes dos governos israelense e dos EUA e diplomatas do Oriente Médio disseram à agência de notícias Reuters, Netanyahu deve ignorar pedido de Biden por cessar-fogo e avançar nas frentes de Gaza e do Líbano.
Por Reuters
Fumaça é vista saindo do subúrbio de Beirute após bombardeio de Israel em 19 de outubro de 2024. — Foto: Mohamed Azakir/ Reuters
Mesmo que “por acaso”, o assassinato do líder do Hamas, Yahya Sinwar, o cérebro por trás do ataque do grupo terrorista a Israel em 7 de outubro de 2023, que desencadeou a guerra na Faixa de Gaza, representou uma grande vitória para Israel, ao menos simbólica.
Agora, Israel buscará aproveitar o momento para avançar nas frentes de batalha na Faixa de Gaza e no Líbano e ignorar a pressão de Washington por um acordo de cessar-fogo até o fim das eleições nos EUA, disseram à agência de notícias Reuters fontes dos governos israelense, libanês e norte-americano, além de diplomatas ocidentais, autoridades libanesas e israelenses.
Nas próximas semanas, segundo as fontes, o governo do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, deve tentar “causar o máximo de danos ao Hamas em Gaza e ao Hezbollah no Líbano” e, assim, criar um “cenário irreversível” e favorável antes de janeiro, quando acontece a posse de quem vencer o pleito dos EUA, em 5 de novembro.
Uma das táticas deve ser a de criar zonas-tampão no sul do Líbano.
Ao intensificar suas operações militares contra o Hezbollah e o Hamas, Israel quer garantir também que seus inimigos e seu principal patrocinador, o Irã, não se reagrupem, disseram ainda as fontes consultadas pela Reuters.
“Há uma nova paisagem, uma nova mudança geopolítica na região”, disse David Schenker, ex-secretário adjunto de Estado dos EUA para assuntos do Oriente Próximo, e analista sênior do think tank Washington Institute.
Alguns diplomatas suspeitam que Netanyahu também está considerando como um cessar-fogo poderia afetar as eleições. Qualquer avanço poderia beneficiar Kamala Harris, quando Netanyahu preferiria lidar com Donald Trump, cujos pontos de vista lineares sobre Israel, palestinos e Irã se alinham mais estreitamente com os seus, afirmam.
“Não há razão para Netanyahu parar suas guerras antes das eleições americanas”, disse Marwan al-Muasher, ex-ministro das Relações Exteriores da Jordânia e vice-presidente de estudos na Carnegie Endowment for International Peace. “Ele não vai dar crédito ou presentes para Harris antes das urnas.”
Por enquanto, Netanyahu parece determinado a redesenhar o mapa ao redor de Israel a seu favor, expulsando seus inimigos de suas fronteiras.
“Ele colocou sua vitória no bolso e está perseguindo suas guerras e impondo um novo status quo (regional)”, disse al-Muasher.
Antes do ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023, Israel estava “disposto a tolerar uma ameaça de alto nível”, respondendo ao lançamento de foguetes do Hamas e de outros inimigos com ataques limitados, disse Schenker. “Não mais. Desta vez, Israel está lutando em muitas frentes. É o Hamas; é o Hezbollah, e o Irã está chegando em breve”, disse ele.
Espera-se que o presidente dos EUA, Joe Biden, use o assassinato de Sinwar para pressionar Netanyahu a encerrar a guerra em Gaza.
Mas, antes de considerar qualquer acordo de cessar-fogo, Israel está acelerando sua campanha militar para afastar o Hezbollah de sua fronteira norte, enquanto avança no campo de refugiados densamente povoado de Jabalia, em Gaza, no que os palestinos e as agências da ONU temem ser uma tentativa de isolar o norte de Gaza do restante do enclave.
Em paralelo, Israel também está planejando uma resposta ao ataque do Irã ao território israelense com mísseis balísticos em 1º de outubro, a segunda investida direta de Teerã a Israel em seis meses.
Netanyahu disse em um comunicado na quinta-feira que a morte de Sinwar “acertou as contas”, mas advertiu que a guerra em Gaza continuaria com toda a força até que os reféns israelenses fossem devolvidos.
O porta-voz militar israelense, Daniel Hagari, disse que a eliminação de Sinwar representou um “grande sucesso” nos esforços para destruir o aparato militar do Hamas, mas acrescentou que havia outros comandantes em Gaza.
No dia seguinte, o vice-líder do Hamas no Catar, Khalil al-Hayya, confirmou a morte de Sinwar e disse que os reféns israelenses não seriam devolvidos até que a “agressão” israelense terminassee suas forças se retirassem.
Além de Sinwar, uma série de ataques de alto perfil eliminou líderes seniores, incluindo o chefe político do Hamas, Ismail Haniyeh, e o chefe da ala militar e número 2 do grupo, Mohammed Deif, olíder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, e seu principal comandante militar, Fuad Shukr.
Mas as ambições de Israel são mais amplas do que vitórias militares de curto prazo, por mais significativas que sejam, disseram as fontes que falaram à Reuters.
Ambições mais amplas
Imagens aéreas mostram tanque israelense disparando contra local onde chefe do Hamas esta
A invasão de Israel ao Líbano, que começou em setembro e ainda está em curso, visa empurrar o Hezbollah cerca de 30 km além da fronteira norte de Israel e para trás do rio Litani, e desarmar totalmente o grupo extremista após 30 anos de apoio militar do Irã.
Autoridades israelenses alegam que estão fazendo cumprir uma resolução da ONU destinada a manter a paz na área e proteger seus residentes de ataques transfronteiriços.
A Resolução 1701 do Conselho de Segurança, adotada após a última guerra de Israel com o Hezbollah em 2006 e violada diversas vezes por ambos os lados, autorizou uma missão de paz conhecida como UNIFIL para ajudar o Exército libanês a manter a área ao sul do rio livre de armas.
Israel alega que as duas forças nunca conseguiram controlar a área do Hezbollah, considerado a força militar mais poderosa do Líbano.
Já o Hezbollah afirma ser necessário defender o Líbano de Israel. Desde o ano passado, seus combatentes têm usado a faixa de fronteira como base para trocas diárias de tiros com Israel em solidariedade ao Hamas em Gaza.
Autoridades israelenses dizem que a única maneira de fazer cumprir a resolução 1701, e garantir o retorno seguro de cerca de 60.000 residentes evacuados do norte de Israel, é por meio de ação militar.
“No momento, a diplomacia não é suficiente”, disse uma fonte diplomática israelense à Reuters.
Autoridades libanesas dizem que a ofensiva contra o Hezbollah deslocou mais de 1,2 milhão de pessoas no Líbano. Israel também enfrentou críticas internacionais devido a incidentes em que suas forças dispararam contra postos de paz da ONU, ferindo vários de seus membros.
Duas fontes ouvidas pela Reuters disseram que a intenção de Israel na área é também expulsar a UNIFIL junto com o Hezbollah.
O oficial de segurança disse que as forças israelenses estavam lutando por acesso a pontos estratégicos elevados, que é onde as bases da UNIFIL estão localizadas.
“O objetivo deles é limpar essa zona de segurança”, disse o diplomata.
A ONU disse que seus pacificadores não deixarão suas posições no sul do Líbano.
“Devemos nos opor… a qualquer sugestão de que se a resolução 1701 não foi implementada é porque a UNIFIL não a implementou, o que nunca foi seu mandato”, disse o chefe de manutenção da paz da ONU, Jean-Pierre Lacroix, a repórteres na segunda-feira, enfatizando que a UNIFIL tem um papel de apoio.
Zona tampão
Israel informou vários estados árabes no ano passado que também queria criar uma zona tampão no lado palestino da fronteira de Gaza.
A ofensiva contínua de Israel em Jabalia, uma área que sofreu intensos bombardeios no início da guerra, tem gerado preocupações entre palestinos e agências da ONU de que Israel queira expulsar os residentes do norte de Gaza.
O Exército israelense nega e afirma que está tentando impedir que combatentes do Hamas se reorganizem para mais ataques.
Em maio, as forças israelenses se deslocaram para o chamado corredor de Filadélfia, uma faixa estreita ao longo da fronteira sul de Gaza com o Egito, dando a Israel controle efetivo sobre todas as fronteiras terrestres do território palestino.
O Irã também está na mira de Israel após o recente ataque com mísseis, lançado em retaliação aos ataques israelenses contra o Irã e seus aliados.
O Oriente Médio está em alerta quanto à resposta de Israel, temendo que isso possa desestabilizar os mercados de petróleo e provocar uma guerra em grande escala entre os arquirrivais.
O ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, disse na semana passada que a resposta seria “letal, precisa e, acima de tudo, inesperada”, embora também tenha afirmado que Israel não está procurando abrir novas frentes.