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Um dos segmentos mais tradicionais da economia e do comércio exterior do Brasil, a indústria de aço e alumínio enfrenta um cenário incerto desde que o então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou uma tarifa de 25% sobre os produtos brasileiros desse setor.
As tarifas, que devem entrar em vigor em 12 de março, afetam um dos principais mercados de destino das exportações brasileiras de aço e alumínio. De acordo com um relatório do Itaú BBA divulgado na segunda-feira (10/02), as produtoras nacionais sem capital aberto — responsáveis por mais de 80% das exportações de aço — podem ser impactadas de forma significativa, especialmente aquelas que dependem fortemente do mercado externo.
Entre as empresas mais afetadas, o relatório cita as operações brasileiras das multinacionais ArcelorMittal e Ternium, ambas com grande produção de aço no Brasil. Já siderúrgicas de capital aberto, como Gerdau, Usiminas e CSN, provavelmente não sofrerão impactos tão severos, pois a exportação representa uma parcela menor de seus negócios, conforme explicou à BBC News Brasil o analista do Itaú BBA Daniel Sasson.
A Gerdau, por sua vez, pode até se beneficiar do novo cenário, pois possui uma parte relevante de sua produção nos próprios Estados Unidos, o que a torna menos dependente das exportações brasileiras.
Segundo Sasson, o relatório foca mais no setor de aço por ser maior do que o de alumínio. No entanto, ele menciona que a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), outra gigante do setor e de capital aberto, também não deve ser fortemente impactada pelas tarifas americanas, uma vez que suas exportações para os EUA não são tão expressivas dentro de seu modelo de negócios. Ainda assim, o analista ressalta que é cedo para medir os impactos concretos da medida.
“As tarifas ainda não entraram em vigor e há espaço para negociações até março. Dependendo das circunstâncias, as empresas podem conseguir direcionar suas exportações para outros mercados e, assim, minimizar os prejuízos”, avalia Sasson.
Empresas mais e menos afetadas
Dentre as empresas brasileiras, a Gerdau pode ser uma das beneficiadas pela imposição das tarifas, já que possui uma produção significativa nos Estados Unidos, cerca de 3,8 milhões de toneladas por ano, de acordo com o relatório do Itaú BBA. Isso significa que, caso o preço do aço aumente no mercado americano, a Gerdau poderá lucrar com a valorização do produto.
Por outro lado, ArcelorMittal e Ternium tendem a ser as mais prejudicadas. A ArcelorMittal, que já tem uma operação relevante no Brasil, adquiriu em 2023 a Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP), cuja produção de aproximadamente 3 milhões de toneladas de placas de aço por ano tem os EUA como um dos principais destinos. Isso coloca essa operação em situação de vulnerabilidade.
A Ternium também enfrenta desafios similares. Desde que adquiriu a Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA) em 2017, sua produção de 5 milhões de toneladas anuais de placas de aço tem grande dependência do mercado norte-americano.
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Outros impactos da medida
As tarifas não afetam apenas o setor de aço e alumínio. Segundo a Câmara Americana de Comércio do Brasil (Amcham), que reúne mais de 3,5 mil empresas, a medida pode resultar na redução das importações brasileiras de produtos americanos. Em 2024, por exemplo, o Brasil importou US$ 1,4 bilhão em carvão siderúrgico dos EUA, um insumo essencial para a produção de aço no país.
“A indústria siderúrgica brasileira tem um alto grau de integração com os Estados Unidos”, destacou a Amcham em nota divulgada na terça-feira (11/02).
Além disso, o aço brasileiro é um insumo estratégico para a indústria americana, sendo utilizado na fabricação de máquinas, equipamentos, peças aeronáuticas, motores automotivos e outros bens industriais.
Embora Trump tenha justificado as tarifas como uma forma de reduzir o déficit comercial dos EUA, a Amcham ressaltou que, no caso do Brasil, os EUA mantêm um superávit na balança comercial. Em 2024, os Estados Unidos registraram um saldo positivo de US$ 7,3 bilhões no comércio bilateral, um aumento de 31,9% em relação ao ano anterior.
Reações e preocupações no Brasil
O governo brasileiro ainda não definiu se tomará medidas em resposta às tarifas impostas pelos EUA. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) está analisando a situação antes de apresentar um posicionamento oficial.
Curiosamente, o Brasil também adota práticas protecionistas no setor siderúrgico. Em outubro, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) elevou para 25% a tarifa de importação de 11 tipos de produtos de ferro e aço, após pressão da indústria nacional, que alegava concorrência desleal de produtos importados.
As associações do setor também manifestaram preocupação. A Associação Brasileira do Alumínio (Abal) alertou que a medida pode dificultar o acesso dos produtos brasileiros ao mercado americano, tornando-os menos competitivos.
Mesmo que a participação do Brasil nas importações americanas de alumínio seja inferior a 1%, os EUA representam um destino importante para as exportações brasileiras, correspondendo a 16,8% do total exportado pelo setor em 2024, o equivalente a US$ 267 milhões.
Outro desafio apontado pela Abal é o possível redirecionamento de produtos de alumínio de outros países para o Brasil, o que poderia gerar uma saturação do mercado nacional e intensificar a concorrência com preços reduzidos.
Já o Instituto Aço Brasil, que representa as siderúrgicas nacionais, demonstrou surpresa com a decisão de Trump, argumentando que o Brasil já respeitava cotas de exportação previamente acordadas com os EUA. Segundo a entidade, os americanos importaram 5,6 milhões de toneladas de placas de aço em 2024, das quais 3,4 milhões vieram do Brasil, evidenciando a dependência do mercado americano em relação ao aço brasileiro.
Diante desse cenário, o setor aguarda novos desdobramentos e possíveis negociações entre os dois governos para mitigar os impactos da nova tarifa.